sábado, 20 de fevereiro de 2010

E a vida segue...


Tarde de quarta-feira. Dia ensolarado.15 horas. Avenida Raja Gabaglia. Um homem corre. Atrás, vários policiais. O medo toma conta de quem está na rua. As pessoas vão para suas casas. As crianças, que antes brincavam na rua, não sabem o que fazer. Começa a gritaria. Portas e janelas são fechadas. Todo mundo tenta se esconder. Eu observo tudo de dentro do prédio onde trabalho, próximo a favela onde ocorreu o incidente.

Nos edifícios próximos ninguém sabe o que está acontecendo. Uns tomam café, outros conversam tranqüilamente, outros ainda estão concentrados em seus trabalhos ou em reuniões.

De repente, um estrondo. Alguns acham que são fogos, outros dizem é tiro. Um, dois, três, quatro, cinco...ninguém sabe ao certo. Eu também, da mesma forma que alguns descrentes de que fossem tiros, acreditei nos foguetes! Pura inocência!

O pânico toma conta de quem está próximo ao local, principalmente dos moradores. Inclusive eu e meus companheiros de trabalho. Não é todo dia que se vê um tiroteio tão perto assim.

Um corpo cai ao chão. Os policiais chegam. Pegam o corpo e o colocam na viatura. Dizem que vão levá-lo ao pronto-socorro. Quem viu pensa: Levar pra que? Se o homem já morreu. Confesso que pensei a mesma coisa, pra que levar para o hospital se ele já estava morto, mas como ninguém quer aparecer na mídia acusado de matar alguém, eles fazem esse lero-lero de fingir que socorreram.

As janelas e portas começam a se abrir. O movimento começa a tomar conta da rua. Junta gente pra ver. No chão, sangue, sangue e mais sangue. Começam os comentários. Merecia morrer. A polícia veio se vingar. O policial fazia parte do tráfico, foi morto por acerto de contas. Foi um assalto, os bandidos não sabiam que era um policial.

Uma senhora lava a calçada que há pouco estava coberta de sangue. Está indiferente a tudo que se passou. De cima dos prédios as pessoas observam a cena, mas sem se intrometer.
Os repórteres chegam. Estão aflitos por notícias. Precisam obter informações. É um furo! Ninguém sabe de nada. Ninguém viu, nem ouviu. É proibido falar. Se descobrirem quem contou já se sabe: vai virar presunto. As crianças e os jovens começam a recolher as balas do chão. São várias. Enchem a mão.

As pessoas vão voltando para seus trabalhos, as crianças para suas brincadeiras. É a vida que segue novamente.

Na internet, a notícia sai mais parecendo um B.O da polícia. “Homem é ferido em troca de tiros com a PM” diz a maioria das manchetes. Nos textos, o mero relato do que a polícia disse. O homem não tem nome. É um qualquer. Ninguém sabe se morreu, se já estava morto quando foi levado para o hospital, se o policial morto um dia antes era bandido ou inocente, se o que causou sua morte foi um assalto ou foi caso pensado.

A informação veiculada ou a falta dela pela imprensa tem um motivo. Será falta de informação?Falta de tempo para apuração? Pressa pra fechar o jornal? Ou era para abafar o fato de um policial estar metido no tráfico?Ninguém sabe...

O que se sabe é que alguém morreu, assim como morrem milhares de outros todos os dias. Culpados ou inocentes ninguém sabe. Às vezes se noticia, às vezes não. Pode haver indignação, quando morre um inocente, tristeza e até mesmo felicidade quando é um bandido. Mas sempre, logo depois, as pessoas voltam para seus trabalhos, inclusive eu, que tinha ainda vários releases e matérias para fazer; suas casas, seus lazeres, seus estudos e quem morreu fica pra trás...ninguém sabe, ninguém lembra....

É a vida que segue novamente...

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